Cultura é um conceito ligado à criação e utilização de valores, regras e costumes (mores) por parte de um povo. É efectivamente a linguagem falada por um povo; a ‘água onde nos banhamos e o ar que respiramos’, como dizia um professor meu. Neste sentido ao termo cultura subjaz a construção de uma sociedade humana que comunica entre si e, que assim, vai evoluindo individual e socialmente.
Segundo Lévy existiram três tipos de cultura: a cultura de tradição oral, a cultura das tradições escritas e, finalmente (aquele que emerge no mundo contemporâneo) a cultura em rede (mais comummente designada por Cibercultura). A primeira foi uma cultura de tipologia ancestral ligada às tradições orais; é anterior ao aparecimento da escrita e aqui a sabedoria encontra-se nos registos pronunciadas e transmitidos de geração em geração dos mais velhos (os mais sábios) para os mais jovens. Neste primeiro tipo de cultura estamos perante um sentido transmitido num determinado momento do tempo e do espaço. A cultura escrita traz a novidade da fixação das mensagens que anteriormente eram transmitidas num determinado espaço e tempo; agora a mensagem poderia ultrapassar a dimensão espacio-temporal e entrar numa dinâmica interpretacional diferente; ora é precisamente aqui que Lévy mostra que a cultura da escrita leva à fixação do sentido podendo ser considerada como o ‘universal totalizante’ porque a escrita preserva o sentido estático de uma determinada mensagem. A escrita conta algo fora do seu contexto, mantendo-se o sentido como o ‘universal totalizante’. Por isso com o aparecimento da escrita surgem os problemas hermenêuticos ligados, por um lado, à fixação do sentido e por outro à multiplicidade das interpretações que procuram sempre atingir esse mesmo sentido (daí o aparecimento, também, do problema da tradução – por vezes a tradução não capta o verdadeiro sentido daquilo que se quer transmitir -). A terceira forma de cultura (a actual e em pleno desenvolvimento) designa-a Lévy por Cibercultura. Mas… o que se entende por ‘ciber–cultura’? Como surge e como se desenvolve? Onde? Quando? Quais os seus aspectos positivos e quais os seus aspectos negativos?
O conceito de Cibercultura surge num devir histórico ligado à problemática da comunicação. Segundo Einstein existiram três bombas – a demográfica, a atómica e a das telecomunicações – sendo que esta última foi marcante para o aparecimento desta nova forma de estar cultural. No entanto, e apesar dos desenvolvimentos instrumentais, não podemos dizer que se deve apenas a esta revolução industrial e instrumental o aparecimento de uma nova cultura – Cibercultura -. A Cibercultura é uma cultura diferente de todas as anteriores porque ela é construída na indeterminação de um sentido global; ela “(…) constrói-se pela interdependência / interconexão das mensagens entre si por meio da vinculação com as comunidades virtuais em criação que lhe dão sentidos variados numa permanente renovação.” (Lévy, P., Cibercultura, pg. 15). A Cibercultura surge do dilúvio informacional no qual temos de aprender a navegar, nadar ou flutuar para procurar um sentido (que não é totalizável porque não se impõe) no complexo de informação disponível. Construindo-se no Ciberespaço (conceito criado por William Gibson em 1984 para designar “(…) o espaço de comunicação aberto pela interconexão mundial de computadores e das memórias dos computadores” (Lévy, P., Cibercultura pg. 92) a Cibercultura é o “conjunto de técnicas (materiais e intelectuais), de práticas, de atitudes, de modos de pensamentos e de valores que se desenvolvem juntamente com o crescimento do ciberespaço” (Lévy, P., Cibercultura, pg. 17). Compreende-se assim que Ciberespaço e Cibercultura são conceitos complexos e interdependentes. Enquanto o Ciberespaço é o conjunto integrado de: infra-estrutura material de comunicação, universo de informação e seres humanos que alimentam e consomem esse mesmo universo possibilitado pela técnica, a Cibercultura é aquilo que é gerado pelo Ciberespaço (como já se disse anteriormente o “conjunto de técnicas (materiais e intelectuais), de práticas, de atitudes, de modos de pensamentos e de valores que se desenvolvem juntamente com o crescimento do ciberespaço” (Lévy, P., Cibercultura, pg. 17)).
Assim sendo a Cibercultura, porque se gera numa rede de redes, é o ‘Universal sem totalidade’, ‘o sistema da desordem’, ‘a transparência labiríntica’, o ‘sistema de sistemas’ e, ao mesmo tempo, o ‘sistema do caos’ (Lévy, P., Cibercultura, pg. 111). Através dos computadores (instrumento) e da internet (tecnologia) a Cibercultura tende à interconexão geral das informações, das máquinas e dos homens tornando-se, assim, universal; por outro lado ela é um universal indeterminado (em que cada nó da rede pode construir ou desconstruir o sentido já feito) e, portanto, não totalizavel (sem identidade de sentido). Mediador de inteligência colectiva (e em breve ‘o principal equipamento colectivo de memória, pensamento e comunicação’ (Lévy, P., Cibercultura, pg. 169) o Ciberespaço traz o dilúvio da informação e ao mesmo tempo permite um acesso de todos aos processos dessa inteligência colectiva que se constrói culturalmente com auxílio do instrumento e da tecnologia.
Em si mesmos instrumento e tecnologia não podem ser considerados nem bons nem maus; o contexto e o ponto de vista determinam o valor moral dos mesmos. Porém também não são neutros porque condicionam as possibilidades de acesso ao conhecimento e à informação (bem como à cultura, diria). A perspectiva com que se olha o uso da tecnologia pode também ser positiva ou negativa. Autores como Bauman ou Virilo apresentam uma perspectiva negativista do uso do ciberespaço alegando a substituição do real pelo virtual, o isolamento, o desaparecimento do contacto humano, entre outros. Este medo descabido é rebatido pelas perspectivas optimistas (das quais Lévy é defensor) alegando que a Cibercultura não é uma sub-cultura virtual, mas sim uma cultura emergente que possibilita a reinvenção das relações humanas (num ciberespaço), bem como um crescimento paralelo e interconectado entre o real e o virtual.
Exemplos desta reinvenção são os negócios virtuais, a economia virtual, o ensino cooperativo assistido por computador (CSCL), o hipertexto, as simulações, as comunidades virtuais, a música… e as árvores do conhecimento. Tentando compreender alguns destes exemplos eis aqueles sob os quais me vou debruçar:
- Hipertexto;
- Simulação;
- Árvores do Conhecimento.
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